quinta-feira, 16 de julho de 2020

O berço e a vida




Ah! Se tu soubesses o valor da fantasia!
A liberdade perdoada da inocência
Palavra feia não conhecia
Moleira mole sem consciência

Se a tivesse não cresceria,
pequeno e ingênuo se manteria.
Longe de tanta demagogia,
ganância, ambição, falsa ideologia.

Bate a porta todos os dias,
se não mata fere, deixa hemorragias.
Marcas profundas na democracia,
conchavos, Congresso, uma porcaria!

Ah! Se tu soubesse o valor da fantasia!
Ainda hoje seria,
uma criança carregada de alegria,
sem perceber o que a maturidade lhe tiraria.

sexta-feira, 10 de julho de 2020

"O QUE IMPORTA É A PRODUÇÃO"

Em minhas incursões pela poesia, faz muito tempo, saindo de uma grande confusão que a vida em alguma hora nos coloca, decidi experimentar, sem compromisso e a toque de caixa essa poesia doida, urgente, e sem direção.

Hoje entendo que, naquele momento, era o que se fazia necessário e fazia total sentido. 

Agora, revendo o que fiz, escolhi o trecho inicial e adaptei/modifiquei uma palavra aqui e outra ali para dar-lhe melhor velocidade e fazer dizer exatamente o que quis dizer.

O poema completo, sem essas pequenas alterações está no meu livro "Erogenia" .


O que importa é a produção ! (fragmento 2020)


O que importa é a produção / preencher todos os espaços vazios / a qualquer custo / não importando / se estamos fartos por dentro / a visão / a mensagem / tem de ser transmitida / seja qualquer a forma / engolir o globo ocular / calcular perfeitamente o que dizer / enegrecer o branco da folha de papel / fazer verso / cordel / dançar sobre a máquina / lançar sobre o parágrafo um olhar curioso / “parágrafo : você está errado” / sempre dizer o que deve ser dito / parodiar situações grotescas / situar-se na falta de lugar / lotar o Maracanã / enchê-lo de palavras / desafio ímpar / catalogar / procurar a si mesmo no dicionário / atravessar essas polegadas / como se atravessa a Belém-Brasília enquanto escreve / formar uma... / não! / diversas famílias / saber que os versos estão certos / semi-metrificados / calcados em amparo legal / Digerir palavras ?/ Jantar a crônica diária? Talvez... / tomar banho / Sim, mas não, não parar / Fumar um king size (melhor  não) / achar interessante e não estressante /aquilo que nunca viu / engarrafar o trânsito / no meio do caminho / Não pegar a pedra / manter o ritmo / não perder o fôlego / correr de qualquer jeito / sentir dor no peito /mas continuar a correr / fazer cara feia / torcer o nariz / mas ler, gostar,  pedir bis / repetir a rotina sem ser redundante / mas ainda assim achar interessante / sinta-se num cofre de banco / sinta-se em Madureira / sinta-se num armário embutido /sinta-se na Rio Branco / Mas sair do lugar comprimido / e ser livre sem medo do risco / Pois risco de poeta é poesia / e com ela é que a gente é feliz.    

terça-feira, 3 de março de 2020

SEGUNDO ESTUDO ANACREÔNTICO – AFÃ DÓRICO - por Vitor Ferreira


Firme a casa do Pai,

Ame as armas do Caos,

Force a porta que cai,

Fique seguro nas mãos.



Pátria cerca após,

Beijo doce do breu;

Creta, pira em Cós;

Braços, dar-te aos teus.



Monte o dorso corcel.

Lance o peito atroz.

Verta a alma ao céu.

Morte ao amigo feroz.

    

Campos de Zeus está,

Calma coro temor,

Rasgue o tafetá,

Deite-se, solo de amor.


sábado, 29 de fevereiro de 2020

SAUDADES DE UM VELHO AMIGO - por Guaracy Muniz Carioca

Será que te encontro? E te reconheço?
Será que me reconheces?
Será que daí escutas
as minhas preces?

Aquele vinho que não tomamos juntos.
Tantas histórias, tantos assuntos
Troca de experiências em meio a brincadeira.
Um ipê florido. Falar besteira.

Incerta certeza
que gera a discussão.
Meu cafezal em flor
Acordes de violão.

Tuas conquistas, meu orgulho
Teu abraço, meu abrigo.
Tapetes de flor de jambo.
Saudades de um velho amigo.

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2020

NA CORDA BAMBA - por Guaracy Muniz Carioca

Segue a alma encarnada equilibrando-se sobre a frágil corda da vida. Sente o peso do corpo por sobre os pés. Caminha lenta, vacilante, pois há névoas no vale e não se enxergam os horizontes.
Pode olhar para trás, mas não retornar. Doem as solas dos pés em contato com a fina e tesa corda. Dói o peso dos anos sobre os joelhos. Dói o peso das mortes dos amigos queridos por sobre os planos.

Vem o vento das mudanças com lufadas inesperadas, nos empurrando para fora da pequena e frágil zona de pequenos confortos que criamos.

Seguir adiante é necessário. É obrigatório. É imprescindível.

A vara é o contraponto. É o pesar no lado oposto ao que estávamos nos inclinando. É a opinião oposta, incômoda, indigesta. É o desconhecido batendo à sua porta. É o convite para sentar-se à mesa com teus inimigos, teus temores e traumas.

E a fé é o que te faz dar mais um passo quando você não quer nada além de saltar e cair e se libertar da gravidade a lhe ferir os pés, da desesperança a lhe ferir a mente, do vazio a lhe ferir o coração. A fé te faz dar mais um passo quando a névoa é espessa e já não se vê nem corda, nem vara, nem nada de interessante mais adiante.
É preciso apaixonar-se pela incerteza para receber o agridoce beijo do surpreendente. E o tropeço te empurra ao passo indesejado até que se perceba que tínhamos asas que nos foram cortadas desde o momento em que nascemos e que só a perseverança as trará de volta com toda sua plenitude original.
E a corda...A corda era apenas a borda do ninho.


sábado, 11 de janeiro de 2020

PARNASIANO - por Clayton Craveiro


Das musas do Monte Parnaso
De cada coisa um extrato, 
Meu pólo assimétrico, por assim ser eu trato. 
O grato pelo ser grato
não indica o consumado ato
Mas há de saber que em seu prato
há labor, há saber, há pecado
o androceu no geniceu
não há melhor transgressão
arsenikó kai thilykó
Etílico, eu como 
se eu isso, eu aquilo
Eu idílico,
Eu Apolo,
no Parnaso fico.




AMORA - por Clayton Craveiro

Deitado na cama, se a janela estiver aberta, consigo ver um pé de amoras. Não aquelas amoras que aparecem na foto de geleia de supermercado ou sache de suíte de hotel. Amoras silvestres pretinhas e compridinhas. As raízes estão do lado do muro do vizinho que não liga para o pé e nem se dá conta do quanto gosto de amoras. Melhor assim. 😋

No fim do outono a amoreira perde toda sua folhagem. Fica pelada como uma árvore fantasma. A lua quando nasce no horizonte no final da tarde costuma aparecer atrás dos galhos secos.

Em agosto começa a brotar para depois fazer a festa dos canários, pardais, tucanos, claytons, e outros passarinhos que aparecem por aqui.

Nesse calorão de janeiro, suas folhas já começam a amarelar. Mas ainda faz aquela boa sombrinha.

Passa o tempo e ela, em seu ciclo sagrado, nem se dá conta da felicidade plácida que dá aos outros com seus frutos, sombra ou simplesmente por estar ali.

A vida devia ser assim: uma amoreira. Ando muito bucólico...